quarta-feira, 27 de abril de 2016

Redes sociais

Você está ocupado e, de repente, soa um sinal de seu dispositivo eletrônico (computador, tablet, telefone celular): é uma notificação do Facebook ou coisa semelhante.

Você corre para pegar seu dispositivo (o telefone, provavelmente), aperta um botão, vira a página com um dedo ainda molhado (estava lavando pratos, por exemplo) e lê:

"Fulano de Tal comentou seu status."

"Que legal!"

Você aperta outro botão, vai à publicação em questão, procura o comentário e lê:

"KKKKK"

Sim, há certas emoções que somente as redes sociais nos podem proporcionar...

terça-feira, 26 de abril de 2016

Enquanto alguém ainda se lembrar destes homens…

RASPAIL, Jean. Quem se Lembra dos Homens? São Paulo: Globo, 1989.

[Qui se Souvient des Hommes, 1986.]

Li-o há cerca de 10 anos e fiquei bastante impressionado com a história deste povo dos confins de nosso continente.

Quem se Lembra dos Homens? de Jean Raspail é um livro fantástico que, numa combinação de estudo antropológico e narrativa (semi)ficcional, tenta reconstituir a história de um dos mais singulares povos que já habitaram as Américas, o qual chamava a si mesmo "os homens"  como muitos outros grupos humanos em todos os tempos.

Numa migração cuja lembrança se perdeu na noite da história, os alakalufs (como são conhecidos hoje) chegaram a um dos extremos do mundo, a Terra do Fogo, e lá viram passar os conquistadores do Sul da América, fugindo deles como de todos os povos com que toparam, tentando apenas sobreviver.

Uma leitura emocionante, que ninguém fará sem refletir profundamente, depois da última página, sobre a Humanidade e sua(s) História(s).

Trecho da orelha do livro:

E eles chamavam a si mesmos de Homens. Haviam chegado àquele extremo da Terra que, bem mais tarde, foi nomeado Terra do Fogo  ao término de uma migração tão longa que já a haviam perdido na memória. Empurrados incessantemente por novos invasores, tinham atravessado um continente e milênios na ignorância e no medo. Haviam se estabelecido num lugar onde, ao que tudo indicava, ninguém poderia alcançá-los, de tão cruéis que eram o céu, a terra e o mar naquele inferno austral. Foram talvez um povo, depois não passaram de clãs, de famílias. Um dia, e será amanhã, não existirá mais ninguém além de Lafko  Lafko, filho de Lafko, filho de Lafko, desde o início dos tempos , o último do Homens, aquele que vemos, na primeira e na última página deste livro, tentando encontrar na tempestade a praia onde ele poderá morrer, sob os olhos de Deus, solitário.
Neste intervalo entre o sonho de Henrique, o Navegador, a aparição dos navios de Magalhães e o desaparecimento dos Homens, estes "selvagens" viram a história passar e submeteram-se a ela. Amanhã, Lafko vai se perder na noite.
Quem se lembra dos Homens? Jean Raspail, após ter encontrado uma das últimas canoas dos alakalufs (esta é a denominação moderna deste povo), não os esqueceu. Neste livro  que, por falta de opção, ele qualifica como "romance", mas "epopeia" ou "tragédia" talvez fossem mais exatos , ele recria o destino destes seres, nossos irmãos, que os Homens que os viram hesitaram em reconhecer como Homens.

Cama, mesa e banho

DIBIE, Pascal. O Quarto de Dormir: um estudo etnológico. Tradução de Paulo Azevedo Neves da Silva. Rio de Janeiro: Globo, 1988.

[Ethnologie de la Chambre a Coucher. Éditions Grasset & Fasquelle, 1987.]

O Quarto de Dormir: Um Estudo Etnológico de Pascal Dibie é uma leitura muito instigante. Li-o há uns 10 anos, com muito interesse, e gostei. O autor considera-se “amante da preguiça” e, quando lhe é infiel, produz suas pesquisas, como este livro, em que traça um estudo histórico e etnológico de como o ser humano tem dormido até hoje, desde as cavernas, enrolado em peles, até as camas modernas de hoje (ou da década de 1980, quando a obra foi escrita).

Assim, o autor debruça-se sobre o sono de nossos ancestrais das cavernas (boa proteção contra o frio e os animais), sobre esteiras, nas primeiras camas, em nichos em paredes, tatâmis, além da origem dos colchões e edredons, até as extensões do quarto de dormir, que mudou de natureza e foi incorporando outras funções e apetrechos, como o banheiro.

A posição do quarto dentro da casa, do porão ao sótão (por exemplo, atrás da cozinha, para ser aquecido); as relações do quarto com os demais cômodos da casa, os comportamentos de “cama, mesa e banho”, o surgimento das privadas (chamadas no início “cadeiras de latrina”, pois se tratava de cadeiras com uma abertura no assento, embaixo da qual se punha um vaso para recolha dos dejetos) – tudo isso é comentado, e se vê a história do comportamento de parte da humanidade dentro de casa, principalmente no quarto.

Nem a nossa popular rede, herdada dos indígenas, foi esquecida – o autor a experimentou e apreciou!

Acrescente-se que o estudo abrange também tudo o que se pode relacionar com esta parte tão importante da casa: do comportamento social familiar através dos tempos até o surgimento dos relógios despertadores…

Uma leitura que recomendo, de preferência numa poltrona bem confortável ou numa rede bem preguiçosa, não necessariamente no quarto de dormir.

Texto da contracapa:

Simples canto de caverna coberto de peles de animais ou suntuoso aposento de palácio com grande leito de dossel, o quarto de dormir foi e continua sendo a peça mais importante da habitação, onde o homem passa pelo menos a terça parte de seu tempo. Ao contar a história dessas quatro paredes – testemunhas dos atos mais íntimos do ser humano – o etnólogo francês Pascal Dibie constrói um estudo original, em que aponta as diversas relações entre o objeto de sua análise e os mais variados aspectos culturais nos quais se inserem, como a religião e a sexualidade, a arquitetura e a decoração.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

IMPEÇA, não IMPESSA

Em português, o tempo presente do subjuntivo é formado a partir da 1ª pessoa do singular do presente do indicativo. Isto vale para quase todos os verbos, mesmo irregulares (com exceção dos verbos que não possuem aquela forma verbal).

O verbo IMPEDIR é irregular: temos aí um /s/ representado por Ç. Sua forma na 1ª pessoa do presente do indicativo é IMPEÇO, por isso todas as formas do presente do subjuntivo de IMPEDIR também são grafadas com Ç, pois são derivadas daquela:

Impeça, impeças, impeça, impeçamos, impeçais, impeçam.

Talvez a Abril tenha dispensado o revisor por engano, numa leva de demitidos; sugiro recontratá-lo.

Esperando marido

Sempre houve certo desprezo (e ainda o há) contra as áreas de humanidades: dizia-se, em outros tempos, que as ciências sociais em nada contribuíam com a sociedade, pois não “salvavam vidas” nos hospitais, não ajudavam a abrir estradas, não melhoravam a produção rural nem davam formação para as carreiras do Estado.

E no âmbito das próprias ciências sociais, os cursos da área de letras eram os mais desprestigiados, até execrados: devido à grande presença de mulheres, eram chamados de “faculdades espera-marido”, porquanto alguns diziam que serviam apenas para dar formação às mulheres, sem que necessariamente entrassem no mercado de trabalho – como no filme O Sorriso de Mona Lisa.

Mas parece que as coisas mudaram.

Nossa atual primeira da classe no quesito “bela, recatada e do lar” é formada em DIREITO…

Língua materna ou língua-mãe?

Erro – e grave, parece-me – é traduzir a locução inglesa mother tongue como LÍNGUA-MÃE. A tradução correta é LÍNGUA MATERNA ou PRIMEIRA LÍNGUA.

Explico-me.

LÍNGUA-MÃE é aquela que deu origem a outras línguas, como é o caso do latim em relação às línguas que dele evoluíram: português, castelhano/espanhol, catalão, francês, italiano, romeno, rético, galego etc.

Já LÍNGUA MATERNA é aquela à qual somos expostos desde que nascemos, língua em cujo ambiente crescemos, língua por meio da qual se desenvolve em nós a faculdade da linguagem. É a primeira língua que cada um de nós aprende. No meu caso – junto com mais uns 240 milhões de pessoas – a língua materna é o português.

Num documentário exibido na TV Escola – sobre países africanos e asiáticos que tentam fortalecer suas línguas maternas em face do avanço do inglês – tal erro de tradução de mother tongue se repete várias vezes.

A confusão entre ambos os termos é mais um exemplo de que estamos formando tradutores que não dominam a própria língua.

domingo, 17 de abril de 2016

Muro anti-ianque

Donald Trump promete que, se for eleito presidente dos Estados Unidos, construirá um muro ao longo de toda a fronteira com o México; o objetivo, segundo ele e seus adeptos, é separar de vez ambos os países e impedir que os mexicanos entrem ilegalmente nos EUA levando drogas, crimes e outras mazelas sociais atribuídas aos imigrantes.

Mas talvez a construção desse novo muro da vergonha seja uma iniciativa positiva para ambos os lados.
 
Sim, talvez os próprios mexicanos gostem da ideia, se pensarem nela com mais calma, e sejam beneficiados pelo muro também.
 
Afinal, como sabemos, todos os criminosos norte-americanos fogem ou sonham fugir para... o México!

sexta-feira, 15 de abril de 2016

A espada e a toga

Uma coisa para pensar:

Em 1937, Aníbal Ponce publicava sua obra Educación y Lucha de Clases, que se encerra relembrando uma história dos tempos do tirano argentino Juan Manuel Rosas. Em 1842, para conter os focos de agitação e revolta que surgiam em oposição a seu governo nas poucas escolas do país, Rosas nomeou como diretor do ensino primário ninguém menos que o... chefe de polícia!

Nada para espantar-nos. Os latino-americanos nos acostumamos a ver os militares como protagonistas em momentos de agitação política.

Mas parece que as coisas mudaram. Em dezembro de 2001, quando caiu Fernando de la Rúa e a Argentina teve três presidentes em um mês, lembro-me de ter lido um comentário de que nem os militares argentinos queriam assumir o governo de lá.

Hoje no Brasil os militares estão em paz, recolhidos à caserna, respeitando a lei e as instituições como se nada de anormal estivesse acontecendo. Nada "militar", digamos.

O protagonismo que temos visto é da Justiça: juízes, promotores, procuradores, Ministério Público, ministros do STJ, TCU, TSE, STF...

Enquanto isso, o governador de São Paulo nomeia como secretário de Educação... um desembargador.

Espero que seja apenas coincidência.

Santarém, PA, 15/4/2016.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Democracia cordial

Cada dia me convenço mais de que a sociedade brasileira é doente. Trata-se de uma doença crônica de mais de 500 anos, cujos sintomas se mostram mais graves nos dias atuais.

Não vou nem mesmo citar os inúmeros preconceitos que ainda persistem em nosso país. (E é lamentável que muitas pessoas não tenham consciência ou vergonha de suas falhas morais nem se esforcem para vencê-las.)

É normal que haja opiniões políticas divergentes em todos os lugares  somente os néscios não sabem disso.

Mas agredir ou incitar a agressão (física ou apenas moral) de pessoas com opiniões diferentes; negar atendimento médico por motivos de divergência política; pedir que uma intervenção militar instaure uma ditadura; usar cargo público (eletivo ou não) e a máquina do Estado para assumir protagonismo e influir na opinião da sociedade; enfim, achar que os fins justificam os meios e assim agir; além de outras coisas, como apoiar certas condutas execráveis para que se realizem seus desejos políticos  tudo isto é, para mim, demonstração de que, como disse Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil:

"A democracia no Brasil foi sempre um lamentável mal-entendido."

Parece que ainda o é. Infelizmente.

Santarém, PA, 14/4/2016.

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quarta-feira, 13 de abril de 2016

Limpas o teu, sujas o meu

Se eu acreditasse em azar, diria que sou muito azarado. Certas coisas já me ocorreram mais de uma vez, deixando-me aquela sensação de déjà vu.

Exemplifico.

Jamais coloquei lixo na frente de casas de vizinhos; para a coleta, cada um deve pôr o lixo na porta de sua casa. É algo tão obviamente próprio da civilitas, que nem consigo pensar em um proceder diferente disso.

Mas um vizinho meu colabora com a limpeza pública de modo peculiar: ele atravessa a rua e põe seus enormes sacos de lixo na frente do condomínio onde moro: quando os cães e urubus (e haja urubus em Santarém!) rasgam os sacos e espalham o lixo, a imundície toda fica na minha calçada, e a dele fica limpinha!

Um bom lema para um brasão de família: “Levando vantagem em tudo!”.

Alguns dirão que se trata de coisa de pouca monta, sem importância; afinal, temos problemas mais graves para resolver.

Não o nego.

Mas nossos problemas têm uma base comum cultural que precisa ser mudada.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Veados, viados e vírgulas

Vejam como o uso da pontuação é importante. O vocativo deve vir sempre acompanhado de vírgula. Leiam mais sobre o assunto no artigo Salvem o Jorge, salvem-nos dele; ou
 
Lição-bônus:

Quem diz o que quer, ouve o que não quer… E é pior ainda quando o que foi dito não é o que se queria dizer!
 
Adendo:

Seja qual for a pronúncia desta palavra, neste sentido (pejorativo, ofensivo em relação aos homossexuais) ou como designativo genérico de animal cervídeo, a grafia correta dela é VEADO.
 
Já VIADO é o “nome de um pano de lã às riscas ou veios próprio para vestuário que não seja de luto” (Dicionário Caldas Aulete); “antigo pano listrado” (Dicionário Michaelis).

domingo, 10 de abril de 2016

Indústria das multas?

Vejo, num programa de TV sobre infrações e multas de trânsito nos Estados Unidos, um aplicador de multas a carros mal estacionados mandar um recado a cada um dos infratores:

- "Não gostou de ser multado? Estacione direito de agora em diante e jamais verá minha cara feia novamente!"
 
Lá como cá, o Estado incentiva a venda de carros, mas ninguém pode estacionar onde quer; e assim como os brasileiros, os ianques também reclamam muito das multas aplicadas devido às infrações que cometem.
 
O fenômeno é mundial. E não tenho dó de quem é multado - a não ser que a multa tenha sido aplicada indevidamente.
 
Os brasileiros que reclamam de multas têm uma coisa a fazer: respeitar as normas de trânsito - e não serão multados.
 
Ou elejam políticos que prometam abolir as multas - criando o caos em nossas cidades.