quinta-feira, 17 de abril de 2014

Anacronismo

Matei um pouco da saudade das aulas que tive com o Prof. João Adolfo Hansen no curso de Letras da FFLCH/USP. Diz ele logo no começo de seu livro sobre o Padre Manoel da Nóbrega e a educação no século XVI:
"Quando se fala da educação, do ensino, da instrução e da catequese desenvolvidos pela missão jesuítica, deve-se especificar a historicidade desses conceitos nas circunstâncias luso-brasileiras em que ocorrem para não generalizar anacronicamente os modos como são entendidos hoje. A sociedade portuguesa do século XVI não é burguesa, iluminista ou liberal. Sua experiência do tempo é outra, diferente da experiência temporal moderna, pois pressupõe a presença providencial de Deus como Causa e Fim da sua história. Também é outra sua doutrina de poder, que não é democrática; de “pessoa humana”, que é escolástica; de linguagem e realidade, que é motivada como participação das coisas, homens, eventos e palavras na substância metafísica de Deus. Fundamentadas metafisicamente e ordenadas pela teologia-política católica, as doutrinas de tempo, história, poder, pessoa, linguagem e realidade mobilizadas nas práticas do programa catequese e escola são corporativas, integrando-se nas malhas das relações pessoais que constituem a hierarquia do Estado monárquico português."HANSEN, João Adolfo. Manuel da Nóbrega. Recife: Massangana, 2010. p. 11-12.
Não se trata de defender práticas de outras épocas e gentes que pensavam de outra maneira; au contraire! Mas a muitas pessoas falta discernimento para não cair no anacronismo tosco e fácil de condenar homens do passado de acordo com padrões do presente. Que dirão nossos descendentes, daqui a 200 anos, de práticas que temos hoje por corretas?
Diz-se que o rei persa Cambises, ao "comemorar" a conquista do Egito, há 2.500 anos, surrou a múmia de um faraó. Acho que estamos um pouquinho mais evoluídos do que os persas de então, porquanto já consideramos coisas como essas uma abominação.
O livro está disponível no repositório do Domínio Público, no formato PDF, e pode ser baixado gratuitamente pelo atalho abaixo:

Santarém, Pará, 17/4/2014. Editado em 19/9/2015.

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