domingo, 24 de novembro de 2013

Graças a Deus, Zamenhof... e Pelé!

Ou como Pelé, sem o saber, ajudou um brasileiro na União Soviética
O número 75 de Inko, revista da Cooperativa Cultural dos Esperantistas, sediada no Rio de Janeiro, traz interessante entrevista de Fabiano Henrique com o conhecido esperantista brasileiro Amarílio Hévia de Carvalho, conhecido também como Papai Noel de Barra do Garças, cidade mato-grossense – por se vestir de Papai Noel na época do Natal, obviamente. Amarílio é grande admirador do ex-presidente Lula e de Dilma Rousseff, e esteve na posse de Lula (2003 e 2007, reeleito) e Dilma, vestido a caráter.
Veja nº 1992, 24/1/2007

No meio esperantista, Amarílio é conhecido também por suas camisetas, que ele produz e vende em todos os eventos (congressos, encontros, simpósios etc.) de que participa. Tive a honra de conhecê-lo em 1995, quando participei do VII Encontro Sul-Brasileiro de Esperanto (VII-a Sud-Brazila Renkontiĝo de Esperanto) em Campos do Jordão, SP. Naquela ocasião, comprei uma bela camiseta alusiva ao evento, a qual era de ótima qualidade e durou muito tempo. Ainda recebi um brinde: um pacotinho de incenso indiano Padmini, o melhor que já usei até hoje (lembro-me agora de que já faz um bom tempo que não uso incenso...).
As famosas camisetas de Amarílio Carvalho, expostas no refeitório  VII Encontro Sul-Brasileiro de Esperanto (12 a 15/10/1995)

Outro feito de Amarílio Carvalho é seu monólogo Tiradentes, que ele já apresentou, em português e esperanto, em muitos lugares no Brasil, tendo-o apresentado também em Hanói, Vietnã, em 2012, por ocasião do 97º Congresso Universal de Esperanto (97-a Universala Kongreso de Esperanto) ali realizado.
Na citada entrevista, Amarílio fala um pouco de sua vida, de quando ouviu falar da língua internacional esperanto em 1949, aos 16 anos, de seus professores e outros esperantistas brasileiros com quem conviveu, de seu monólogo Tiradentes, entre outras coisas; fala ainda de curiosa experiência que viveu durante sua viagem em companhia do violonista Darcy Villa Verde à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, URSS, em 1974.
O episódio deu-se da seguinte forma: Após passar por outras cidades soviéticas, Amarílio chegou a Vilna, capital da então República Socialista Soviética da Lituânia, e lá visitou um esperantista local, em cuja casa ele bebeu vinho, um "delicioso vinho comunista"... e ficou "meio bêbado". Amarílio errou o caminho para o hotel em que estava e perdeu-se no centro de Vilna.
Sentado num banco de uma grande praça, inquieto, meio bêbado e perdido, Amarílio decidiu “fervorosamente orar a Deus e ao santo Zamenhof (o iniciador do esperanto), pedindo uma salvação milagrosa". Nesse momento, apareceu por ali um chofer de táxi, ao qual Amarílio saudou em russo e disse que era brasileiro, usando as poucas palavras que conhecia em língua russa.
O taxista começou a gritar: “Pelé! Pelé! Pelé!” Outros taxistas vieram, gritando o nome do famoso futebolista brasileiro. Depois dos devidos cumprimentos e apresentações  apesar do desconhecimento mútuo da língua alheia  o chofer conduziu Amarílio, bêbado e tremendo, ao hotel.
Será que Pelé sabe que sua fama mundial de jogador de futebol ajudou um esperantista brasileiro perdido na extinta União Soviética?
Se você sabe esperanto, leia a entrevista completa aqui:

O brinde de Amarílio Carvalho tornou-me fã deste incenso.
Fonte: www.mercadolivre.com.br.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Jogo de xadrez

©iStockphoto.com/Bluestocking

Eis que surgem nova Rainha e novo Rei, com seus Cavalos, e ocupam as Torres. Serão substituídos os Bispos, mas os Peões continuarão os mesmos, e jogando no mesmo espaço.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Anedotas sobre Attila József

ANEDOTAS SOBRE ATTILA JÓZSEF

Sándor Szathmári
Traduzido do esperanto por Júlio César Pedrosa

Attila József em 1924. Fonte: Wikipedia.
Posso orgulhar-me de ter tido boa amizade com o eminente poeta Attila József.

Boa amizade? Com aquele homem agitado e nervoso que sempre batalhava com todos?

Sim! Justamente por isso sei com certeza que ele me estimava, porque ele sempre discutia, até disputava comigo. Com aqueles dos quais não gostava, ele se portava com uma gentileza glacial, e não os tinha como dignos de uma disputa de ideias.

Não reconhecia nenhuma autoridade. Sem nenhum respeito atacava e refutava seus atacantes e refutadores. A discussão era seu esporte, de que nasciam suas fagulhas do espírito, que ele depois entretecia em seus poemas.

Ocorreu certa vez, em 1933, que eu proferi uma palestra em um clube sobre a crise econômica internacional da época, que então abalara profundamente o capitalismo liberal.

Depois da palestra, muitos dos que ali estavam presentes se juntaram em torno de mim, e começou o costumeiro bate-papo após a conferência, o simpósio extraoficial, quando os interessados faziam suas observações, replicavam ou davam-me indicações sobre o tema.

Attila József também estava lá, mas não se aproximou totalmente de mim. Ficou um pouco afastado, às vezes ouvia a conversa, ia para lá, vinha para cá, e via-se que ele guardava algo digno de ser dito.

Também conjeturei, e de certa forma temi, que ele logo viria, explodiria, refutaria e daria cabo de minhas asserções.

Por fim o grupo de discussão começou a desfazer-se. Dissipou-se o círculo de gente em torno de mim. E então Attila József, com passos firmes e decididos, veio até mim.

— Você é... você é... um bom palestrante!

Disse isso abruptamente, de supetão, de modo jogado, com um descuido meio afetado.

E daí se virou e foi embora. Ele visivelmente se envergonhava de sua fraqueza.

Esse reconhecimento foi, para mim, a maior honra de minha vida. Tão valiosa quanto uma medalha de ouro. Se até ele devia reconhecer-me, então eu devia ser sem dúvida um bom palestrante.

Certa vez ele morou junto com Lajos Nagy, que escrevia prosa. Ambos eram pobres, de maneira digna a escritores de talento. Outro escritor húngaro, László Vajthó, escreveu: “O escritor ou ganha dinheiro ou diz a verdade”. Ora, eles por preferência diziam a verdade e não ganhavam dinheiro. Moravam num quarto em comum.

Certa noite, ao se recolherem para dormir, eles como de costume conversavam. Então entre outras coisas Lajos Nagy disse estas palavras: “... o mar azul...”.

Attila József logo replicou:

— O mar não é azul, é verde!

Mas Lajos Nagy também não era de temperamento fácil. Passou a demonstrar que o mar é, de fato, azul.

Com estas palavras ele acendeu o pavio explosivo. Attila József então citou poetas competentes que cantaram o verde mar.

Em se tratando de citações, Lajos Nagy também não era laico. Citou em dobro muitos autores, de Safo a Jean Cocteau, passando por Byron, cuja poesia fora inspirada pelo azul do mar.

Seguiram-se depois as descrições de marinheiros, conquistadores e cientistas. (Desnecessário até dizer que nenhum deles tinha visto o mar. Como mencionei, eles de preferência diziam verdades.)

Enquanto isso eles já se tinham deitado, mas mesmo assim continuavam esgrimindo. A discussão acirrava-se e, por fim, foi Lajos Nagy que primeiro se cansou.

Para terminar a infrutífera disputa, ele decidiu capitular:

— Você me convenceu — disse tranquilo. — Devo conceder que você tem razão: o mar é, de fato, verde.

Disse “Boa noite!” e apagou a luz.

Attila József calou-se, contrariado. Sentia-se fora de seu elemento vital. Lajos Nagy logo adormeceu, e ele fervia por dentro. Por fim, depois de uns 15 minutos de luta consigo mesmo, explodiram as forças internas dentro dele. Gritou:

— Ei, Lajos!

— Grrr! — acordou Lajos Nagy com um súbito rosnado. — Quê? Que é?

— Mas saiba você que o mar não é assim TÃO VERDE, como você imagina!

Traduzido de:
SZATHMÁRI, Sándor. Anekdotoj pri Attila József. Hungara Vivo, 1967, n-ro 4 (7a jaro), p. 17.
Disponível em: <http://www.autodidactproject.org/other/szathmari_jozsef.html>. Acesso em: 12 fev. 2016.



quarta-feira, 13 de novembro de 2013

A maldição do faraó

Aquenáton, Nefertíti e duas de suas filhas. Fonte: www.arqueologiaegipcia.com.br.

Há algum tempo, numa manhã de domingo, tive a impressão de que havia baixado em um de meus vizinhos o espírito do faraó Aquenáton (ex-Amenófis ou Amenhotep IV).
Tão logo o Sol deu as caras, o vizinho tratou de dar início às homenagens ao disco solar Áton, que a tudo ilumina e abençoa com seus raios, possibilitando a fecundação da terra e do ventre das mulheres, enchendo de leite as mamas das fêmeas para a nutrição dos rebentos, fazendo subir as águas do Nilo, as quais, quando se vão, deixam suas margens cobertas dos nutrientes que levarão a abundantes, fartas colheitas, evitando-se os sete anos de espigas finas e vacas magras preditos por um hebreu de nome Zé.
Mas parece que a incorporação do faraó em nosso amigo tupiniquim não foi bem sucedida. Ao invés do Hino ao Sol, o que se ouviu foi uma procissão de cantos profanos e blasfemos, que nos feriam e ensurdeciam os ouvidos do corpo e da alma! E o danado do felá amazônida não se apercebia disso, enquanto fazia, paralelamente à execução de tais cânticos, o ritual semanal de lavagem de sua carruagem de quatro rodas, que ele julga talvez mais bela que a conduzida por Ramsés II, o Grande, na gloriosa batalha de Kadesh.
O tempora! O mores! Blasfêmia! Anátema! Um grito de horror ecoou por todo o Alto e Baixo Egito, da Quarta Catarata ao Delta do Nilo, de Abidos (ou seria Óbidos) a Alexandria! Juntei minha voz ao coro dos aflitos, rasguei as vestes, vesti-me com um saco e cobri-me de cinza, prostrando-me de rosto ao solo e orando à deusa Ártemis de Éfeso (também conhecida como Diana ou Míriam), pedindo um milagre, um alívio para tal situação. E ela respondeu, enviando-me a musa Euterpe, que me orientou a atacar com o que de melhor se produziu sob a inspiração das Nove Irmãs.
Enquanto lá fora ele ofendia os deuses, dentro de casa eu me defendia...


Disso tudo escapou Aquenáton: tão logo desceu ele à tumba, juntando-se a seus ancestrais, os sacerdotes egípcios de Ámon, em conluio com as autoridades da terra de Kemit, fizeram o país retornar à antiga religião, amaldiçoando e riscando da História o nome e a memória do faraó rebelde e sua família.
Mas a História e a Arqueologia o reencontraram.

Santarém, Pará, 13/11/2013. Editado em 3/8/2015.